minha meta de ano novo é a continuidade: voltar pra realidade, olhar pro caminho que estou percorrendo e seguir fazendo, sem achar que é “ano novo vida nova” e que estou recomeçando de novo - às vezes sinto que já recomecei várias vezes e já cansei disso; às vezes sinto que só recomeço porque sigo me dando chances de ser mais feliz.
comecei a fazer o curso do Mulheres que Escrevem (MQE), com a maravilhosa
, que começou com algumas perguntas básicas:Por que você escreve?
Qual é a sua obsessão de escrita?
Para quem você escreve?
O que te faz escolher escrever?
O que é importante para você?
básicas no sentido basilar da coisa, fundamental.
tive dificuldade de responder. a resposta rápida e intuitiva é que escrevo para mim, para me entender, para fazer sentido das coisas. Kafka disse que escreve pra existir e me subscrevo dessa noção. sempre existi escrevendo: minha tomada de consciência caminha junto com a alfabetização, pelo momento da vida e pelo registro do meu pensamento, que fui lapidando com o tempo.
isso é o suficiente?
se escrevo para mim, não é só fazer um diário? guardar na gaveta e pronto?
e o desejo que leiam o que escrevo? não é motivo suficiente?
Gloria Anzaldúa, bibliografia dos encontros do MQE, diz que “Tenho medo de escrever, mas tenho mais medo de não escrever”.
acho que tenho mais medo de saber que não tentei, acima de tudo. ou melhor, como já disse em outra ocasião:
Tenho medo de esquecer, então escrevo Tenho medo de escrever, mas às vezes me esqueço Não quero escrever nem esquecer: Mas faço os dois na mesma medida Tenho medo que saibam meu nome. Tenho medo da vala comum. Não quero ser em vão e nem vã Tenho medo de dar meu endereço Tenho medo de conhecer e de quem eu conheço Tenho medo que saibam tudo e que não saibam nada Do que digo e deixo de dizer Tenho medo de atender a ligação Tenho medo que não me liguem. Medo de ligar demais, de ligar de menos De deixar de fazer e, ainda, de fazer Tenho medo de ser muito, ser pouco, ser ninguém e ser alguém Tenho medo de ter medo, ainda por cima, também.
não sei para quem escrevo, além de mim, mas acho que nessa minha breve experiência dessa news (com quatro meses e 10 edições!) tem sido uma forma de me aproximar de pessoas com quem quero conversar, de gente que me interessa, de assuntos que me interessam discutir com o mundo. tem um grupo no telegram do povo das newsletters que me dá muita alegria participar e tem me dado um senso de gentes afins que outros grupos não me deram, nem mesmo no teatro.
acho que a escrita tem sido a mídia que escolho para mediar minha existência, ou me aproximar da minha essência, como uma lente ou uma tela.
inseri esse meu poema em homenagem à minha amiga-xará Luiza Aranha que me disse que não gostava de poesia, o que obviamente me levou a fazer uma curadoria de muitos poemas que gosto pra mandar pra ela (embora ela ache que sejam só os dois que já mandei) além de me dar o empurrãozinho pra compartilhar poesia por aqui - que, no fim, é o gênero que mais me interessa, com que tenho familiaridade, que me dá liberdade.
escrever poesia é seguir o fluxo de um movimento que me acompanha há muitos anos, trazendo pra consciência e pra intencionalidade: algo que aprendi no teatro (alô Stanislávski) e que carrego comigo também na escrita. no fim ser artista é muito sobre assumir o risco, encarar as possibilidades e seguir tentando. continuo sendo atriz quando escrevo, ainda que fora do palco. estreando em novos espaços e experimentando algo que sempre me acompanhou, mas que escolho trazer pra mais perto. ao invés de ver tudo como novo de novo que às vezes me assusta, penso que é um olhar diferente em um processo contínuo de vida que estou construindo.
abro meu mapa do tesouro com vocês pra que possam me cobrar ou incentivar - a cobrança externa ajuda quando a energia interna esmorece. um pacto de escritora e quem me lê aqui e lerá no futuro, espero.
a Júlia Greco compartilhou na
sua meta de um ano para virar escritora, e foi um texto que muito me ajudou a pensar meus objetivos. sou muito da execução e pouco do planejamento, então as luzes que apontam os caminhos me atraem sempre: pego o facão e abro qualquer picada, se a direção estiver definida.esse ano sai um livro de poesia: anotem.
Para conhecer uma mulher que escreve
terminei essa semana de ler “Virgindade inútil - novela de uma revoltada” de Ercília Nogueira Cobra, escrito em 1927. alguma news a indicou, não lembro quem (se você souber me relembra, porque foi uma dica de ouro).
escritora da época do modernismo mas não afiliada ao movimento, escreveu sobre a condição da mulher branca naquele tempo, especialmente em São Paulo e Rio, no país fictício da Bocolândia (sempre houveram nomes ótimos para o Bostil). o subtítulo é quase excessivo porque não existe possibilidade de ler e não sentir a revolta da autora a cada frase.
Na ficha da Bocolândia, além da população (20.000.000 de bocós), da geografia e outros dados, diz:
“A religião seguida é interessante, porque consiste em fazer exatamente o contrário do que manda o Evangelho em que se baseia”(p. 14)
muito mudou para as mulheres em quase cem anos: não existe mais dote para se casar, impossibilidade de uma carreira profissional liberal, diferenciação entre a educação dada ao homem e a mulher. é incrível para entender de onde viemos e como chegamos aqui hoje. destaco um trecho da personagem principal, Cláudia:
-Ora, que inocentes os homens! Isto [um quadro pintado por Cláudia] é um pedaço de vida, meu filho! Vê-se a todo momento este quadro pelas ruas, pelas igrejas, pelos bordéis, pelos conventilhos. Achas sinistro? É a obra social. É o retrato de uma meretriz e de uma solteirona na velhice. Pintei o que vi, e não tenho dúvidas de que a realidade seja sinistra. É obra da moral; a moral, pois, é que sinistra. Se educassem a mulher para vida e para o trabalho esta tela não poderia ser pintada.
Eu não ganho nada com isso, mas se você quiser pode comprar essa edição belíssima. E você pode me seguir no Goodreads pra falar sobre livros 🙂
feliz ano novo! ainda é janeiro, então pode.
começamos com alegria (a posse) e depois com uma rasteira (os terroristas) pra dar aquele susto em quem achou que a gente ia ter paz. o trabalho é longo, mas continuamos.
essa é a edição número 10 então pra quem vem desde de o número 1, obrigada, e pra quem tá me recebendo pela primeira vez, boas vindas <3
fiz uma oficina com a Ryane Leão ontem, de quem sou muuuuito fã, que vai me acompanhar ainda por muito tempo - muitas reflexões sobre a escrita, minha relação com ela e com a vida. era sobre escrita curativa e foi, realmente, um bálsamo. bagunçou tudo aqui, e me ajudou a retomar essa news - no meu planejamento era pra ter voltado 2 semanas atrás (sentiram falta?) mas não tinha conseguido me encarar: porque escrever é sobre isso, e não é todo dia que consigo fazer. mas hoje é o dia da retomada. continuamos.
Primeiramente, preciso dizer que amo esse tempo fluido da newsletter e por isso estou aqui um mês depois da publicação -- porque só cheguei agora no seu email na caixa de entrada, tinha acumulado coisas em janeiro.
Mas na real tou passando aqui apenas pra dizer que quero é essa listinha de poemas!! Também sou do time da sua amiga, que não lê e pensa que não gosta muito do gênero... Mas a verdade é que nunca dei muita chance também.
Feliz ano novo atrasado e que seja um ano de coragem pra lidar com todos esses medos -- que eu, você e provavelmente muito mais gente massa compartilhamos 💛
Agora é 1:30 da manhã e acabei de ler seu post.
Como estou virtualmente desempregado, estava escrevendo um poema para uma festa de lindy hop que vai ter sábado. Desde segunda feira estava contemplando e nada aparecia no papel. Fiquei insistindo mentalmente em fazer uma balada porque, na última vez, a balada ficou bem legal.
Saiu um fake soneto com uma série transgressões que fariam Camões virar Cospés.
Mas acho que o pessoal vai gostar. Eu gostei. É sobre lindy hop, canções angelicais e cometas. Acho que era mais pra sair uma brisa mesmo. Depois te mostro xD
É uma loucura. Eu escrevo pra mim, mas quero que as pessoas fiquem felizes com o que escrevo quando leem ou ouvem. Isso me desafia a não cair na melancolia e tentar coisas mais solares. Embora seja tentador fazer um cosplay de Álvares de Azevedo com 30 e uns anos xD.
Ao mesmo tempo, tenho uma vergonha danada, tenho medo da minha família descobrir que escrevo. Pior: tenho medo que minha família goste xD.
E loucuras e contradições à parte, pra mim é um bálsamo perceber que a gnt compartilha algumas angústias. E me anima muito quando vejo que vc tá correndo atrás (eu tb fico perdidinho perdidinho com planejamentos. Ás vezes, me paralisa).
Vc estar motivada, criando, escrevendo, motiva no lado de cá do rio Pinheiros a se arriscar tb.
E, por favor, continue essa newsletter pq seus textos são maneiros demais.